A trajetória de Messias, que é surdo, é um retrato de inspiração para alunos por todo o país
Messias, orientando, e Enilde, orientadora, sempre tiveram muita parceria para a realização de todos os trabalhos. (Foto: arquivo pessoal)
Sara Meneses / Agência UniCEUB
Um dicionário juvenil do corpo humano para estudantes surdos foi a tese que o professor Messias Ramos Costa entregou neste ano na conclusão do curso de doutorado em Linguística pela Universidade de Brasília.
O docente e pesquisador também é surdo de nascença. Ele tornou-se uma referência dentro da comunidade surda, principalmente por desenvolver seu trabalho todo voltado para a criação de sinais em Libras. Mas a jornada do estudante começou muito antes e passou por várias etapas.
Foi em uma aula do mestrado com a professora Enilde Faulstich que Messias apresentou um trabalho sobre o tema. Na sinalização, o então mestrando fez um gesto que não correspondia ao que era entendido com o conceito de espermatozóide.
A descoberta surgiu assim na vida do acadêmico, que também é professor na UnB. Messias precisou compreender primeiro como é pensar em Língua, no sentido da Linguística. A partir deste momento, juntamente com sua professora orientadora, ele começou a estudar a fundo sobre como funciona uma enciclopédia, os termos e como era desenvolvido o pensamento para a criação de um sinal-termo.
Um sinal para o coração
O sinal-termo na Língua de Sinais é utilizado para conteúdos específicos, o sinal precisa ter uma alta contextualização para não interferir na compreensão do Surdo sobre o assunto. “Os surdos são conceituais, por isso é necessário antes, projetar, em sua mente, o conceito adequado para desenvolver os sinais com precisão”, explica Enilde Faulstich.
No mestrado, o estudante elaborou uma base para a criação de sinais-termo para coração, variando com sua necessidade e função. No doutorado, Messias conseguiu não apenas aprofundar seu estudo e pesquisa dos sinais-termo, mas também aplicar e analisar pelo Brasil e em Portugal.
Apresentação do trabalho de Doutorado do professor Messias. (Foto: arquivo pessoal)
“Como surdo, usuário da língua de sinais e como professor, Messias tem uma característica peculiar de ser um pensador profundo. Ele cria todos os termos de uma forma conceitual, é um trabalho exemplar que precisa ser divulgado”, reforça a orientadora.
Messias, ao longos dos anos, teve muito destaque e reconhecimento, além de ter desenvolvido um trabalho de referência global, foi o primeiro professor substituto da disciplina Língua de Sinais Brasileira (LSB), no Curso de Letras do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas, onde dá aulas há mais de dez anos.
O sonho de Messias agora é poder divulgar seu trabalho e levar o conhecimento sobre a importância de sinais-termo por todo o país. Para a orientadora, Enilde, este é mais um passo concluído, de muitos que virão, na carreira de seu aluno.
“Eu sou apaixonada por todos os meus alunos surdos. Eu não passo a mão na cabeça, mas faço questão de oferecer todos os caminhos possíveis para eles conquistarem seus sonhos”, diz Enilde.
A apresentação completa da tese de doutorado do Messias está disponível pelo Youtube, para acessar clique no link.
Ferramentas
Em meio à pandemia, o professor explica que as dificuldades foram superadas de forma simples, o contato remoto foi uma forma de se comunicar com alunos surdos. O apoio de ferramentas e da tecnologia permitiu, também, que Messias desenvolvesse os trabalhos acadêmicos.
“A pandemia não interferiu na conclusão do meu trabalho, tivemos que nos adaptar e a comunicação fluiu bem. O que aconteceu foi que tivemos que adiar um pouco a apresentação, que aconteceria em dezembro e foi adiada para janeiro. Mas, o trabalho já vinha sendo desenvolvido há muito tempo e, por isso, já tínhamos uma base para terminá-lo”, explica o pesquisador.
No Brasil, de acordo com o Instituto Locomotiva e a Semana da Acessibilidade Surda, existem cerca de 10,7 milhões de pessoas com deficiência auditiva. Entre elas, 2,3 milhões com surdez profunda.
Entrevista com o professor Messias e a orientadora Enilde, com participação das intérpretes Brenda Rodrigues e Andreia Brasília.
Para muitos estudantes surdos, o acesso à educação é muito restrito e, por isso, muitos acabam desistindo no meio do caminho. Segundo o Censo Escolar (2017), aponta que há 2.138 alunos surdos matriculados no ensino superior no país.
Além disso, apenas sete entre as 59 universidades federais brasileiras oferecem cursos de graduação em Libras (Língua Brasileira de Sinais), segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
Por Sara Meneses
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira
Fontes:
Comments